A Descolonização Portuguesa no século XX

Por: Aharon Pereira

A propósito da comemoração dos 100 anos do nascimento de Mário Soares, resolvemos abordar o tema da descolonização portuguesa do século XX, um dos episódios mais marcantes da nossa história recente, onde Mário Soares teve um papel essencial no processo.

Figura central da transição democrática em Portugal, Soares foi um dos protagonistas que enfrentou o complexo desafio de terminar o império colonial português, que, até à Revolução dos Cravos, em 1974, resistia ao vento da história e à vaga global de descolonização. A sua liderança, primeiro como Ministro dos Negócios Estrangeiros no I Governo Provisório e, mais tarde, como Primeiro-Ministro, foi determinante para a condução de negociações com os movimentos de libertação e para o estabelecimento das bases das independências em Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

A descolonização portuguesa foi um processo turbulento, por vezes dramático, marcado por pressões internacionais, pela luta armada nas colónias e pelas profundas divisões internas em Portugal. Mário Soares destacou-se por tentar equilibrar, de forma pragmática, os interesses nacionais e os anseios de independência dos povos colonizados. Contudo, este esforço não esteve isento de críticas, tanto da direita, que via na perda das colónias um golpe no orgulho nacional, como da esquerda, que o acusava de ceder demasiado aos interesses das potências ocidentais, leia-se EUA, no contexto da Guerra Fria.

As complexidades deste processo, incluindo os dilemas éticos e políticos enfrentados, os custos humanos das guerras coloniais e o impacto económico e social do regresso dos retornados a Portugal, fazem parte de um legado muito polémico que continua a suscitar debate. O papel de Soares neste contexto é, por isso, um testemunho da sua visão política, da sua coragem em tomar decisões difíceis e do seu compromisso com a construção de um Portugal democrático e europeu.

Este tema, passados quase 50 anos das independências das ex-colónias, continua a ser um dos maiores tabus em Portugal. Abordá-lo é, por isso, uma enorme  responsabilidade, pois implica considerar os chamados "retornados", termo usado para designar os portugueses que abandonaram as colónias na sequência do 25 de Abril, os seus descendentes, que cresceram a ouvir as versões contadas pelos pais sobre o que aconteceu durante a descolonização e os políticos que tiveram a responsabilidades de conduzir o processo.

As pessoas que por força da descolonização tiveram que abandonar os territórios coloniais, bem como os povos das ex-colónias, foram as vítimas do processo de formas diferentes evidentemente, mas ambas sofrendo grandes mudanças e desarranjos nas suas vidas. Veremos à frente o que lhes aconteceu, e a razão de ainda hoje permanecem traumatizados e zangados com a descolonização.

Neste artigo, analisaremos as etapas principais da descolonização portuguesa do século XX, o impacto das escolhas políticas de Soares e como este período moldou não só a história das antigas colónias, mas também a identidade contemporânea de Portugal.

A Descolonização

A descolonização envolve muitas figuras civis e militares. O nosso foco recai sobre aqueles que determinaram o processo ou seja, ou seja, Mário Soares e Almeida Santos, que tiveram a difícil tarefa de tomar decisões cruciais. Não foram os únicos, mas estes dois políticos foram realmente quem determinou o rumo da descolonização.

Recentemente, Mário Soares tem sido mencionado e elogiado, no contexto da celebração do centenário do seu nascimento. Este é um momento oportuno para abordar com verdade, profundidade e sem tabus um tema em que a sua atuação foi decisiva mas sobre a qual não existe consenso. É também uma forma de reconhecer o mérito de um homem, com coragem, que assumiu a necessidade inadiável de descolonizar, libertando Portugal do estigma de ser visto pela comunidade internacional – incluindo quase todos os estados reconhecidos pela ONU – como um regime colonialista, opressor, que negava aos povos o direito à autodeterminação, e ainda os direitos humanos por ser governado quer em Portugal, quer nas colónias por um regime ditatorial.
O tabu construído em torno deste tema, resulta de nem tudo ter corrido bem, e em alguns aspetos mesmo muito mal. Mas alguma descolonização corre na perfeição? A resposta é Não. Nenhuma correu sem deixa maculas, sem lesar interesses, e sem traumatizar as pessoas envolvidas. No caso português poderia ter sido diferente? Claro que sim. É sempre possível. Mas como iremos ver, as condicionantes eram de tal ordem, e as dificuldades tantas, que o quadro em que o processo se poderia desenvolver, estava fixados à partida. Havia poucos graus de liberdade. Não seguiremos tabus no desenvolvimento deste texto, repetimos.

Lembramos que o processo de colonização português começou no século XV, mais precisamente em 1415, quando Portugal conquistou Ceuta. Este evento marcou o início da expansão marítima e territorial portuguesa, dando início à era das descobertas e da colonização. Lembramos que antes do século XX, ocorrera a independência do Brasil, que Portugal reconheceu oficialmente 1825. Portanto outros processos de descolonização já tinham ocorrido antes do século XX.

Salazar e a descolonização

É habitual referir-se que o grande culpado pela descolonização caótica do século XX, foi Salazar, o que é certo e é verdade. O problema é que não se explica com rigor as razões. E se assim se fica, não é necessário explicar o que aconteceu de certo ou errado no pós 25 de abril, que interpretamos como mais um capítulo do tabu que aludimos no início deste artigo.

Salazar, o Primeiro-ministro eterno do Estado Novo, teve uma posição extremamente contrária à descolonização e à independência das colónias portuguesas. Durante o seu governo, Salazar defendeu a manutenção do império colonial português e recusou veementemente a ideia de que as colónias portuguesas deveriam obter a independência.

Postura de Salazar sobre a descolonização:

  1. O Império Português como uma "nação pluricontinental":

    • Salazar via as colónias portuguesas como parte integral do império e acreditava que as colónias não eram territórios separados, mas faziam parte de uma "nação pluricontinental". Para ele, não havia diferença entre Portugal metropolitano e as suas colónias, que eram vistas como prolongamentos naturais de Portugal.

    • A ideia de que as colónias podiam ou deveriam ser independentes era vista como uma ameaça à unidade do império e à identidade nacional portuguesa. Esta é uma ideia que presentemente nos parece totalmente absurda, mesmo delirante. Mas era o que Salazar pensava. Devemos lembrar que Salazar nunca saía de Portugal. Em (1936) visita a Espanha para reunir com Franco. Em (1937) visita a Paris para participar na Exposição Internacional, nada mais. Nunca visitou as colónias.
      A falta de contacto direto com as colónias reforçou a abordagem centralista e desconectada da realidade que caracterizou a política colonial do Estado Novo. Muitos problemas locais, como desigualdades, tensões raciais e resistência à colonização, eram minimizados ou ignorados em Lisboa.

  2. Rejeição do processo de descolonização:

    • Salazar rejeitou sempre a pressão internacional para descolonizar, especialmente durante os anos pós-Segunda Guerra Mundial, quando as potências coloniais europeias começaram a perder o controlo sobre os seus territórios ultramarinos.

    • A autodeterminação dos povos e o movimento de independência das colónias eram totalmente repudiados por Salazar, que via isso como uma perda de soberania e uma ameaça ao prestígio de Portugal.

  3. A "missão civilizadora":

    • A colonização portuguesa era, para Salazar, uma missão civilizadora. Ele argumentava que Portugal tinha o dever de civilizar os povos das suas colónias, introduzindo-os ao cristianismo e aos valores da cultura portuguesa. Essa visão paternalista justificava, aos olhos de Salazar, a permanência de Portugal nas suas colónias.

    • Salazar acreditava que as colónias estavam "inacabadas" em termos de desenvolvimento e que as populações locais precisavam da orientação portuguesa para alcançar o progresso.

  4. Repressão das revoltas nas colónias:

    • Durante a sua presidência, Salazar ordenou a repressão violenta dos movimentos de independência nas colónias, nomeadamente em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. A resistência armada nas colónias foi combatida com forças militares portuguesas, e Salazar nunca considerou a possibilidade de negociações para a independência.

  5. A guerra colonial:

    • A resistência às independências acabou por gerar a Guerra Colonial Portuguesa (1961-1974), que envolveu conflitos em várias colónias e se prolongou mesmo após a saída de Salazar do governo (1968), quando Marcelo Caetano assumiu a liderança. A guerra foi extremamente desgastante para Portugal e para as suas colónias, mas Salazar nunca se mostrou disposto a aceitar qualquer tipo de negociação política com os movimentos de libertação.

    • Total Estimado de mortos

      • Mortos do lado português: Cerca de 8.800 militares e um número não especificado, mas menor, de civis.

      • Mortos do lado africano: Estimativas combinadas apontam para valores entre 160.000 e 200.000, incluindo combatentes e civis.

Frases e declarações de Salazar sobre a descolonização:

  • "Portugal não pode abandonar as suas colónias. O império português é uma unidade que não se divide." — Esta frase reflete a ideia central da política de Salazar em relação à questão colonial.

  • Salazar frequentemente descrevia a descolonização como uma "entrega à anarquia" e considerava que a independência das colónias implicaria instabilidade e caos, e que as novas nações africanas não seriam capazes de se autossustentar sem o apoio de Portugal.

A postura de Salazar em relação à descolonização foi profundamente conservadora e imperialista. Ele acreditava que a manutenção do império colonial era essencial para a identidade de Portugal e que as colónias estavam inerentemente dependentes de Portugal para seu desenvolvimento e estabilidade.

Mário Soares e Almeida Santos

Mário soares é amplamente conhecido e dispensa apresentações. Almeida Santos não sendo um desconhecido, pelo contrário, mas convém relembrar o seu currículo antes do 25 de Abril de 1974.
Almeida Santos viveu e trabalhou em Moçambique durante cerca de 20 anos. Estabeleceu-se em Lourenço Marques (atual Maputo), onde exerceu como advogado e empresário.

Principais atividades:

  1. 1. Advocacia:

    Era advogado de empresas e de particulares, incluindo casos que envolviam questões comerciais e laborais, típicos de uma sociedade colonial.

    Era conhecido como um advogado de prestígio, atendendo tanto colonos portugueses quanto habitantes locais.

    2. Empresário:

    Almeida Santos envolveu-se em vários negócios relacionados ao setor imobiliário, construção civil e outros empreendimentos típicos de uma economia colonial em crescimento.

    3. Ligações com a sociedade colonial:

    Apesar de viver num contexto colonial, ele não era politicamente alinhado com o regime salazarista. Pelo contrário, tinha uma visão crítica do colonialismo, algo que ficou mais evidente após o seu regresso a Portugal. A sua simpatia pela Frelimo era tolerada pelas autoridades coloniais,

    4. Trabalhou como advogado para a De Beers:
    Esta ligação ocorreu durante o período em que viveu em Moçambique. A De Beers empresa sul-africana da época do apartheid. explorava minas de diamantes. em locais como África do Sul, Botswana, Namíbia e, em alguns períodos, Angola e Moçambique.

  2. É importante constatar que Santos até ao 25 de abril não tinha no seu currículo, nada que evidenciasse estudos sobre colonialismo, descolonização de outras potencias coloniais, não era sequer um académico. Almeida Santos também não tinha tido qualquer experiência governativa.

Salazar: as suas teses absurdas, delirantes e quase demenciais sobre a descolonização portuguesa do sec. XX, tudo dificultou

Mário Soares e Almeida Santos

Colonialismo Inglês vs. Colonialismo Português

Para compreendermos melhor o absurdo da posição de Salazar, é útil estabelecer uma comparação entre as políticas coloniais do Império Britânico e as escolhas feitas por Salazar. Essa comparação revela com mais clareza o erro fatal do regime de Salazar, que acabou sendo o principal fator para a queda e o desaparecimento do Estado Novo. Permitam-nos avançar com uma afirmação que, provavelmente, muitos considerarão polémica: o que derrubou o Estado Novo não foi apenas o Movimento das Forças Armadas, mas a Guerra Colonial, resultante da oposição à política de Salazar. O 25 de Abril, foi apenas o gatilho final, disparado pelo Movimento das Forças Armadas. Sem a pressão da guerra colonial o Estado Novo teria durado mais tempo.

Agora, vejamos as diferenças entre os modelos de colonialismo inglês e português, especialmente no que diz respeito à preparação para a descolonização. É muito útil para verificarmos como Salazar criou um mito do qual resultou uma situação muito pouco favorável a um processo de descolonização ordeiro, pacífico e bem sucedido. Salazar desperdiçou o tempo que teve à disposição para pensar e iniciar a descolonização. Foi de longe o principal erro e mau serviço que prestou a Portugal. Só foi possível, no contexto da ditadura do Estado Novo.

O quadro mostrado é elucidativo das diferenças de processos e das consequências que essas diferenças tiveram no processo de descolonização. Passamos a detalhar alguns itens:

Diferenças na Preparação para a Independência

1. Portugal: Transição Abrupta e Conflituosa

Falta de Preparação

  • Administração Centralizada: Portugal governava as suas colónias diretamente a partir de Lisboa, com pouca autonomia local. A transição para a independência não foi acompanhada de uma transferência gradual do poder.

  • Pouca Educação Local: A política colonial portuguesa não prioritizou a formação de elites locais. Nas colónias, havia uma escassez de líderes qualificados para assumir o poder após a independência.

  • Resistência à Descolonização: Portugal insistiu na manutenção do império até tarde no século XX, com o regime do Estado Novo de Salazar vendo as colónias como parte integrante do território nacional.

Processo de Independência

  • Guerras de Libertação: A independência foi alcançada por meio de conflitos armados, como em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, devido à recusa portuguesa em negociar.

  • Abrupta Pós-Revolução: A Revolução dos Cravos (1974) em Portugal forçou uma descolonização repentina, muitas vezes sem um plano estruturado, deixando as ex-colónias em situações de instabilidade.

Consequências

  • Guerras Civis: A ausência de uma transição ordenada levou a conflitos internos prolongados em várias ex-colónias (e.g., Angola, Moçambique).

  • Fragilidade Económica e Institucional: Muitas colónias herdaram economias dependentes e administrações mal estruturadas.

2. Inglaterra: Transição Gradual e Planeada

Maior Autonomia

  • Administração Indireta: A Grã-Bretanha frequentemente utilizava governantes locais ou elites indígenas para gerir as colónias, permitindo maior familiaridade com a administração antes da independência.

  • Formação de Elites Locais: Houve investimentos limitados na educação e formação de elites locais, permitindo que lideranças indígenas emergissem para assumir o controlo político.

Processo de Independência

  • Negociações Pacíficas: Em muitas colónias britânicas, a independência foi alcançada através de negociações, como na Índia, Gana e Nigéria. Houve exceções marcadas por violência, como no Quénia.

  • Instituições de Transição: A Grã-Bretanha criou estruturas institucionais, como parlamentos e sistemas judiciais, para facilitar a transferência de poder.

Consequências

  • Estabilidade Inicial: Algumas ex-colónias britânicas beneficiaram de uma transição mais estável devido à preparação política e institucional.

  • Desafios Pós-Independência: Apesar da transição mais planeada, muitas ex-colónias enfrentaram desigualdades, conflitos étnicos e dependência económica.

Conclusão

Enquanto o colonialismo inglês proporcionou uma transição ordenada, conseguida em vários casos, o colonialismo português foi marcado por resistência à descolonização e processos abruptos que resultaram em instabilidade prolongada e guerra civil, que se mantem até ao presente no caso de Moçambique. Contudo, ambos os sistemas deixaram legados de desigualdade e dependência, demonstrando que a colonização, independentemente do método, teve um impacto profundamente problemático nas regiões ocupadas.

Quando Soares e Santos tiveram que encarar a necessidade indiscutível de descolonizar, encontraram possibilidades limitadas de atuação, e uma situação internacional muito pouco favorável à continuação da manutenção da administração portuguesa por mais tempo. Independente das opiniões que possamos ter, esta é a verdade. Este facto é objetivo. Salazar pensou mal.

Significa isto que dizemos que não se cometeram erros? Claro que não. Há ainda um outro ator importante na descolonização portuguesa que agiu através da sua influência em determinados militares das Forças Armadas presentes nos territórios coloniais, e que trouxe ainda ,mais dificuldades ao processo. Veremos como.

A vitória humanitária da descolonização: o regresso de soldados vivos, em vez de chegarem em caixões

Dificuldades Enfrentadas no Processo de Descolonização

1. Resistência Interna e Divisão Política

  • Oposição à Descolonização

    Alguns setores da sociedade portuguesa opunham-se à independência das colónias, defendendo, tal como Salazar, que estas eram parte integrante de Portugal. Esta resistência complicou as negociações com os movimentos de libertação, dificultando o arranque do processo de descolonização.

    Divisão Política

    No pós-25 de Abril, Portugal atravessava um período de instabilidade política, caracterizado por governos provisórios e conflitos ideológicos entre forças de esquerda, direita e extrema-esquerda. Mário Soares, então Ministro dos Negócios Estrangeiros, enfrentou fortes críticas de diversos setores ao negociar a independência das colónias.

    A Influência do PCP e da União Soviética

    À época, a União Soviética ainda desempenhava um papel importante na geopolítica mundial. Em Portugal, o PCP (Partido Comunista Português) era uma força política bem organizada, totalmente alinhada com os interesses e a política soviética. Durante a descolonização, o PCP atuou para garantir que o poder fosse entregue aos movimentos de libertação pró-soviéticos, exercendo influência através de figuras como o Presidente da Junta Governativa de Angola, o almirante Rosa Coutinho.

    As decisões de Rosa Coutinho são hoje vistas como tendo contribuído para o início da Guerra Civil Angolana (1975-2002), ao desequilibrar o processo de transição em favor do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola). Com a guerra civil agora encerrada, torna-se essencial abordar estes temas sem tabus, reconhecendo os factos.

    A Guerra Civil Angolana e as Intervenções Externas

    Após a retirada de Portugal, a guerra civil em Angola agravou-se com a intervenção direta de potências externas. O regime sul-africano do apartheid apoiou a UNITA e a FNLA, enquanto Cuba enviou tropas para apoiar o MPLA. Embora a história da guerra civil angolana esteja fora do âmbito deste artigo, é importante sublinhar que a instabilidade foi amplificada por estas intervenções estrangeiras.

    Os Acordos de Alvor

    Assinados em 15 de janeiro de 1975, os Acordos de Alvor marcaram um momento decisivo no processo de descolonização de Angola. Este acordo reuniu representantes de Portugal e dos principais movimentos de libertação angolanos – MPLA, FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola) e UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) – para definir os termos da transição para a independência, proclamada em 11 de novembro de 1975.

    Embora representassem uma tentativa de criar consenso, os Acordos de Alvor falharam em garantir a paz e a estabilidade. A guerra civil que se seguiu revelou as dificuldades de uma descolonização apressada, sem mecanismos eficazes para resolver as divisões internas.

    Apesar das falhas, os Acordos de Alvor simbolizam um marco na história da descolonização portuguesa, refletindo o desejo de Portugal em abandonar pacificamente o seu passado colonial. Contudo, o contexto de enorme complexidade e conflito comprometeu os objetivos de estabilidade e reconciliação, resultando num dos conflitos mais devastadores do continente africano.

2. Negociações com Movimentos de Libertação

  • Falta de unidade nos movimentos: Em Angola, existiam vários movimentos de libertação (MPLA, UNITA, FNLA) que competiam pelo poder, o que dificultou a obtenção de acordos claros.

  • Desconfiança mútua: Os movimentos de libertação viam Portugal como um opressor, e os negociadores portugueses temiam que as independências resultassem em caos ou alianças com blocos comunistas no contexto da Guerra Fria. Foi aliás o que veio a acontecer.

  • Nem Mais Um Soldado para as Colónias

    O tabu da colonização que persiste em Portugal omite sistematicamente uma das realidades mais determinantes para apressar as negociações com os movimentos de libertação: o movimento inorgânico "Nem mais um soldado para as colónias". Este movimento, amplamente apoiado pela esquerda, pela extrema-esquerda, por setores da Igreja Católica influenciados pela Teologia da Libertação, bem como pelas famílias dos soldados e pelo povo em geral, foi uma expressão clara de rejeição ao recrutamento obrigatório para as guerras coloniais.

    Mesmo antes do 25 de Abril, havia uma crescente revolta contra o envio de jovens para combater nas colónias. A após a Revolução, tornou-se evidente o absurdo e a inutilidade de morrer por uma causa amplamente considerada odiosa, errada e perdida. Ninguém queria sacrificar-se por tal motivo. Com a crescente falta de soldados dispostos a combater, o tempo para negociações tornou-se escasso.

    Nos teatros de guerra, muitos dos soldados destacados passaram a conviver com combatentes dos movimentos de libertação, numa convivência que sublinhava a desmoralização e a inutilidade do conflito.

    Desobediência Militar

    Embora a hierarquia militar do regime permanecesse leal a Salazar e, mais tarde, a Marcelo Caetano, muitos oficiais de baixa patente, particularmente os milicianos, simpatizavam com os movimentos de libertação. Estes oficiais não apenas rejeitavam a guerra por convicções políticas e éticas, mas também reconheciam que o conflito estava perdido e não queriam arriscar as suas vidas em batalhas fúteis.

    A desobediência militar e a deserção tornaram-se frequentes, enquanto a falta de interesse em combater se generalizava entre as tropas. Este cenário criou o risco de um vexame militar, com tropas a abandonarem os combates em massa. Tornou-se claro que a situação só poderia ser resolvida politicamente e com urgência.

    Uma Verdade Ocultada

    Faz parte do tabu em torno da descolonização a omissão deste aspeto crucial: não havia soldados dispostos a combater, e os movimentos de libertação não davam tréguas. Este quadro de desmoralização e recusas constantes foi determinante para a aceleração das negociações e para o desfecho político que culminou na independência das colónias.

    O movimento "Nem mais um soldado para as colónias" não foi apenas um grito de revolta; foi uma força decisiva para o desfecho do processo de descolonização e para o fim de uma das mais longas guerras coloniais do século XX.

3. Cronologia Apertada

  • Pressão internacional: Após o 25 de Abril, Portugal enfrentava forte pressão da ONU, dos EUA e de outros países para pôr fim ao colonialismo. A descolonização precisava de ser rápida, mas a ausência de planeamento prévio dificultou a transição.

  • Falta de tempo para preparar as colónias: Ao contrário do colonialismo britânico, que planeou transições graduais, Portugal não teve condições para criar estruturas administrativas ou preparar lideranças locais para governar. A ditadora de Salazar, não podia dar espaço a uma discussão sã e objetiva do processo de descolonização.

4. Problemas Humanitários

  • Retornados: A independência das colónias resultou na deslocação de cerca de 500 mil portugueses que residiam em África. Muitos destes "retornados" chegaram a Portugal em condições precárias, sem apoio económico ou logístico suficiente para recomeçar a vida. A ideia que os portugueses que viviam nas colónias eram só exploradores colonialistas, é falsa, estúpida e absurda. A maioria pertencia à classe média e vivia do seu trabalho.

  • Conflitos armados: Em territórios como Angola e Moçambique, a independência foi seguida por intensas guerras civis entre movimentos de libertação rivais. A rapidez com que Portugal abandonou as colónias gerou duras críticas, especialmente devido à incapacidade de garantir a estabilidade pós-independência.

    Por um lado, exigia-se celeridade no processo de descolonização, refletindo o desejo de libertação rápida do legado colonial e das consequências de uma guerra prolongada. Por outro lado, a velocidade com que a transição foi conduzida foi igualmente criticada, devido às graves consequências, como os conflitos internos e a falta de estruturas políticas sólidas para assegurar a paz e a reconstrução das nações recém independentes.

5. Herança Económica e Social

  • Dependência económica: As colónias eram uma fonte importante de recursos e mercado para Portugal. A sua perda teve um impacto profundo na já debilitada economia portuguesa, agravando a crise económica que o país enfrentava no pós-25 de Abril.

  • Consequências sociais: A sociedade portuguesa enfrentou dificuldades para integrar os retornados e lidar com as memórias traumáticas da Guerra Colonial, que dividiram o país. Adiante falaremos dos retornados.


O Papel de Mário Soares e Almeida Santos

Em resumo, o papel de cada um dos principais protagonista foi o seguinte:

Mário Soares,

  • Diplomacia em tempo de crise: Como Ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares liderou as negociações com os movimentos de libertação, sendo criticado por setores conservadores que o acusavam de "entregar" as colónias.

  • Compromisso com a urgência: Consciente da pressão internacional e da incapacidade de Portugal para continuar a guerra, Soares defendeu uma descolonização rápida, mesmo com o risco de instabilidade nas colónias.

  • Legado controverso: Soares é amplamente reconhecido pela coragem de tomar decisões difíceis, mas a rapidez do processo deixou mágoas profundas entre os retornados e críticas quanto à falta de garantias para as populações das colónias.

  • Escolha de Almeida Santos: Foi Mário Soares que escolheu Almeida Santos para desenvolver o processo de descolonização. Aos dias de hoje, parece-nos que o seu currículo era escasso. A experiência política e governativa de Almeida Santos, foi adquirida após a sua contribuição para a descolonização. e não antes.


O Papel de Almeida Santos

  • Negociação de acordos: Como Ministro da Coordenação Interterritorial, Almeida Santos foi responsável por mediar a transição de poder, elaborando os acordos de independência.

  • Elaboração jurídica: Santos desempenhou um papel crucial na redação de documentos legais que garantiram a soberania dos novos estados, um processo complicado pelas divisões internas e externas.

  • Críticas ao abandono: Almeida Santos enfrentou fortes críticas por "abandonar" as colónias a forças instáveis, especialmente em Angola, onde a guerra civil se intensificou após a retirada portuguesa.

  • Em conclusão:
    Mário Soares e Almeida Santos enfrentaram o desafio de descolonizar um império sem preparação prévia, num contexto de instabilidade política e pressão internacional. Embora a ambos sejam reconhecida coragem e capacidade estratégica, o processo de descolonização continua a ser um tema divisivo em Portugal, marcado por feridas históricas ainda por sarar. A rapidez do processo, apesar de necessária, deixou muitas questões por resolver, tanto para os retornados como para os países africanos que herdaram estruturas frágeis e que , em muitos casos, mergulharam os novos países em conflitos prolongados. Moçambique nunca se recompôs.

As Vítimas da Descolonização Portuguesa

A descolonização portuguesa, ocorrida após a Revolução de 25 de Abril de 1974, foi um processo acelerado, complexo e caótico, que gerou vítimas em múltiplos sentidos. Tanto os povos das ex-colónias quanto os portugueses que viviam nesses territórios sofreram graves consequências humanas, sociais e económicas.

1. Os Povos das Ex-Colónias

Contexto

  • Após décadas de domínio colonial, os povos africanos enfrentaram guerras de libertação sangrentas e, mais tarde, transições políticas abruptas, que nem sempre garantiram estabilidade ou prosperidade.

  • A retirada portuguesa, frequentemente desorganizada, deixou um vazio político e económico que contribuiu para graves crises humanitárias e guerras civis.

Consequências

  1. Guerras Civis:

    • Em Angola e Moçambique, a luta pelo poder entre os movimentos de libertação (como MPLA, UNITA, FNLA em Angola e FRELIMO e RENAMO em Moçambique) mergulhou os países em décadas de guerra civil.

    • Estima-se que milhões de pessoas tenham morrido ou sido deslocadas por conflitos armados, fome e doenças.

  2. Crises económicas:

    • A saída apressada dos portugueses levou ao colapso de infraestruturas essenciais (saúde, educação, transportes).

    • A ausência de técnicos e trabalhadores qualificados, principalmente de origem portuguesa, deixou um défice de competências nos países recém-independentes.

  3. Violência e instabilidade:

    • Muitos civis foram vítimas de massacres e represálias, tanto durante os conflitos de libertação como nas disputas internas pós-independência.

    • A violência entre etnias e fações políticas exacerbou os sofrimentos das populações.

  4. Deslocados e refugiados:

    • Milhares de africanos, incluindo colaboracionistas e minorias étnicas, como mestiços e comunidades de origem europeia, foram perseguidos e forçados a abandonar os seus lares, juntando-se ao êxodo dos retornados para Portugal.

2. Os Retornados

Quem eram os retornados?

  • Eram portugueses (e seus descendentes) que viviam nas colónias e foram forçados a regressar a Portugal após as independências. Estima-se que cerca de 500.000 pessoas tenham retornado, principalmente entre 1974 e 1976.

Consequências para os retornados

  1. Perda de bens e estatuto:

    • A maioria perdeu propriedades, negócios e poupanças ao abandonar as colónias. Muitos tiveram de fugir de forma improvisada, apenas com os bens que podiam carregar.

    • Alguns sentiram-se traídos pelo governo português, que foi incapaz de garantir a segurança e a preservação dos seus bens.

  2. Integração difícil em Portugal:

    • A sociedade portuguesa, economicamente fragilizada após a revolução, não estava preparada para acolher um número tão elevado de pessoas.

    • Muitos retornados enfrentaram desemprego, precariedade habitacional (vivendo em hotéis improvisados) e preconceitos sociais.

    • A designação "retornados" foi frequentemente usada de forma pejorativa, estigmatizando-os como "privilegiados" do regime colonial, apesar do sofrimento que enfrentaram.

  3. Impacto psicológico:

    • A deslocalização abrupta e o sentimento de perda criaram traumas profundos. Muitos retornados tiveram dificuldade em adaptar-se a uma nova realidade, longe do ambiente em que cresceram ou prosperaram. Muitos realmente não retornaram, pois tinham nascido em África e nunca tinham estado em Portugal. Muitos eram pretos ou mestiços, também nascidos em África, com laços débeis a Portugal.

  4. Contribuição positiva apesar das adversidades:

    • Apesar das dificuldades, muitos retornados conseguiram reconstruir as suas vidas e tiveram um impacto positivo na economia e cultura portuguesa. A sua experiência em África trouxe novas perspetivas e conhecimentos para setores como o comércio e a gastronomia.

Apoios para os retornados

Ouve-se frequentemente esta crítica, por parte dos retornados: Fomos abandonados em Portugal. É falso.
Soares em entrevista à RTP, declarou demos-lhe tudo. É falso.

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Houve apoios com algum significado : Foram os suportáveis por uma situação económica de crise. A realidade é a seguinte: A Comissão Interministerial de Apoio aos Retornados (CIAR) foi criada pelo governo português em 1975, durante o período pós-25 de Abril, sob a liderança do Primeiro-Ministro Vasco Gonçalves, no contexto do VI Governo Provisório.

Objetivos principais da CIAR

  1. Apoio de emergência:

    • Organizar alojamento temporário para retornados sem lugar para ficar.

    • Garantir o fornecimento de alimentos, cuidados de saúde e outros bens essenciais.

  2. Integração a médio e longo prazo:

    • Facilitar a inserção no mercado de trabalho, através de programas de emprego e formação profissional.

    • Promover o acesso à educação para crianças e jovens retornados.

    • Apoiar a reinstalação em habitações permanentes.

  3. Gestão de conflitos sociais:

    • Minimizar as tensões entre os retornados e as comunidades locais, especialmente em áreas urbanas sobrecarregadas.

  4. Recolha e gestão de informações:

    • Levantar dados sobre o perfil dos retornados (origem, profissão, necessidades específicas) para orientar políticas públicas.

Atuação e limitações

  • Alojamento: A CIAR organizou a ocupação de hotéis, pensões e outros espaços provisórios para acolher os retornados, mas a falta de habitações permanentes levou a situações de precariedade prolongada.

  • Emprego: Muitos retornados tinham formação técnica ou académica, mas enfrentaram dificuldades em encontrar trabalho em Portugal, agravadas por discriminação e preconceito.

  • Burocracia: A distribuição de apoios financeiros e materiais foi marcada por atrasos e desigualdades, o que gerou críticas à atuação da comissão. Na verdade uns conseguiram tudo, outros pouca coisa. A desorganização e a falta de transparência, deu a impressão de ter sido pior do que de facto foi. A pior critica ao CIAR foi a desorganização com que conduziu a sua missão.

O Legado da Descolonização

Impactos nas Ex-Colónias

  • A descolonização portuguesa é frequentemente vista como um dos processos mais desorganizados entre os países europeus.

  • Para os povos africanos, significou a libertação do domínio colonial, mas à custa de um preço elevado em termos de vidas humanas, estabilidade política e desenvolvimento económico.

  • A herança colonial portuguesa deixou marcas profundas, incluindo desigualdades sociais, dependência económica de potências externas e infraestruturas subdesenvolvidas.

Impactos em Portugal

  • A chegada dos retornados mudou o panorama social e económico do país, criando novos desafios e tensões, mas também enriquecendo culturalmente a sociedade portuguesa.

  • A descolonização contribuiu para um debate prolongado sobre o colonialismo, a memória histórica e a relação de Portugal com as suas ex-colónias.

A descolonização foi, sem dúvida, um momento de transformação profunda, mas também de dor e sacrifício. As vítimas — tanto nas ex-colónias quanto em Portugal — continuam a carregar as cicatrizes de um processo que marcou a história contemporânea.

Contentores dos retornados descarregados junto ao monumento dos descobrimentos. Felizmente os tempos mudaram.

Mário Soares e a Descolonização Portuguesa
Virtudes e Insucessos de uma Liderança Decisiva

A figura de Mário Soares ocupa um lugar central no processo de descolonização portuguesa do século XX. Como Ministro dos Negócios Estrangeiros do I Governo Provisório, Soares assumiu uma tarefa hercúlea: conduzir a transição das colónias africanas para a independência, num contexto marcado por décadas de repressão colonial, guerras de libertação e uma revolução em curso que alterava profundamente a sociedade portuguesa. Com uma postura determinada, Mário Soares foi tanto um protagonista admirado pela sua visão política como uma figura criticada pelos desafios e consequências inerentes ao processo de descolonização.

Virtudes de Mário Soares no Processo de Descolonização

  1. Coragem política num momento crítico
    Após o 25 de Abril de 1974, Portugal enfrentava uma pressão interna e externa esmagadora para pôr fim à sua presença colonial. Soares, com grande coragem, enfrentou as resistências internas do país, nomeadamente de setores militares e políticos que defendiam uma descolonização mais lenta e cautelosa. Ele compreendeu que o tempo não estava do lado de Portugal e que a perpetuação da presença colonial só agravaria o isolamento internacional e os conflitos armados. Ele tinha uma ideia: Portugal sem colónias tinha que integrar o mais rapidamente possível a Comunidade Europeia que na altura era um club de estados ricos fechados aos demais. Ele tinha também os amigos certos na Europa François Mitterrand (França), Willy Brandt (Alemanha Ocidental), Helmut Schmidt (Alemanha Ocidental), Jacques Delors (França), Olof Palme (Suécia), entre outros. As colónias eram um enorme entrave a necessidade de aderir à CEE. Estava certo.

  2. Habilidade diplomática
    Mário Soares destacou-se pela sua capacidade de negociar com as lideranças dos movimentos de libertação, muitas vezes em condições adversas. Os Acordos de Lusaca (1974), que abriram caminho para a independência de Moçambique, são um exemplo do seu pragmatismo político e da busca por soluções negociadas. Apesar das tensões e desconfianças mútuas, Soares conseguiu estabelecer pontes com figuras como Samora Machel (FRELIMO) e Agostinho Neto (MPLA), garantindo que a transição para a independência fosse conduzida, na medida do possível, de forma institucional.

  3. Visão de futuro
    Para Mário Soares, a descolonização não era apenas uma questão prática, mas também ética e política. Ele acreditava que Portugal tinha uma obrigação histórica de libertar as suas colónias, permitindo que se tornassem nações soberanas. Esta visão de descolonização como um passo inevitável e justo contrastava com a ideologia colonialista do Estado Novo e foi essencial para redefinir Portugal como um país democrático e europeu.

  4. Compromisso com os valores democráticos
    Mesmo enfrentando críticas ferozes, Soares manteve a convicção de que a descolonização era essencial para consolidar a transição democrática em Portugal. O seu papel foi fundamental para quebrar o legado colonialista e promover uma nova identidade para o país, baseada no respeito pela autodeterminação e pelos direitos humanos. Eslava certo.

Insucessos e Limitações do Processo de Descolonização

  1. A rapidez da descolonização
    Uma das críticas mais frequentes ao papel de Soares foi a rapidez com que a descolonização foi conduzida, especialmente em Angola e Moçambique. A retirada abrupta de Portugal deixou um vazio político e institucional que contribuiu para a eclosão de guerras civis devastadoras. Embora a urgência da situação não oferecesse muitas alternativas, o ritmo acelerado do processo é apontado como um fator que prejudicou a estabilidade das novas nações.

  2. O drama dos retornados
    A descolonização trouxe consigo a crise humanitária dos retornados – centenas de milhares de portugueses que regressaram das ex-colónias em condições precárias. Muitos sentiram-se abandonados pelo governo, enfrentando dificuldades para se reintegrar em Portugal e recuperar os bens que perderam. Apesar dos esforços de Mário Soares e do governo, os apoios oferecidos foram insuficientes e mal planeados, deixando uma marca amarga em muitos retornados. Foi o pior, do ponto de vista dos portugueses e de Portugal.

  3. Acusações de parcialidade
    Em Angola, a perceção de que Portugal favoreceu o MPLA em detrimento de outros movimentos, como a UNITA e a FNLA, gerou acusações de parcialidade. Embora as escolhas de Soares tenham sido, em parte, influenciadas pelas circunstâncias internacionais e pela necessidade de assegurar aliados confiáveis, a perceção de favoritismo contribuiu para tensões pós-independência.

Um Legado Decisivo

Apesar das críticas e insucessos, o papel de Mário Soares na descolonização portuguesa deve ser reconhecido pelo seu valor histórico. Ele foi um líder que enfrentou um dos momentos mais difíceis da história contemporânea de Portugal com uma visão clara do que era necessário fazer. A sua capacidade de tomar decisões corajosas e de enfrentar resistências internas e externas foi essencial para pôr fim a um império colonial que já não era sustentável, nem moral, nem sobretudo politicamente.

A descolonização foi um processo imperfeito, marcado por desafios e contradições, mas também por avanços significativos. Mário Soares foi, acima de tudo, um político que colocou os princípios da autodeterminação e da democracia acima de interesses conservadores e imediatistas. Ao fazê-lo, ajudou a redefinir Portugal como uma nação moderna, comprometida com os valores democráticos e com um novo papel no mundo. Portugal foi um vencedor da descolonização., juntamente com Cabo Verde, S Tomé e Príncipe e de certa maneira Guiné-Bissau. Os perdedores foram Angola deixada com uma guerra Civil terrível que durou mais de 20 anos e Moçambique com uma guerra que continua até ao presente em partes do território e mais recentemente com acusações de fraude eleitoral.