"China: O Dragão Autoritário”
Portugal - China e Nova Rota da Seda
★★★★★
por Simon Ben-David
Texto #7
A história das relações entre Portugal e China é uma narrativa rica e complexa, marcada tanto por momentos de cooperação como de tensão. O primeiro contato direto entre os dois países ocorreu em 1513, quando o navegador português Jorge Álvares chegou a Guangdong, na costa chinesa, abrindo o caminho para o estabelecimento de relações comerciais e culturais. Posteriormente, em 1557, Portugal conseguiu estabelecer-se em Macau, através de um acordo com a dinastia Ming, transformando-se no primeiro e único enclave europeu na China por vários séculos. Macau desenvolveu-se assim como um importante ponto de ligação entre o Ocidente e o Oriente, funcionando como um centro de trocas comerciais e culturais.
Ao longo dos séculos, a presença portuguesa em Macau testemunhou transformações políticas, económicas e sociais, refletindo as mudanças tanto no império português quanto na própria China, que enfrentou períodos de isolamento, ocupação e renovação. Em 1999, Macau foi devolvida à China, tornando-se uma Região Administrativa Especial sob o modelo "um país, dois sistemas", que caracteriza ainda hoje as suas relações com o governo de Pequim. Este longo relacionamento revela um intercâmbio único entre duas culturas distintas, que deixaram marcas profundas no comércio, na religião, na arquitetura e na língua, unindo os destinos de Portugal e China ao longo da história.
Participação na Nova Rota da Seda
Portugal formalizou a sua adesão à Iniciativa do Cinturão e Rota (Nova Rota da Seda) em 2018, durante uma visita oficial do presidente chinês Xi Jinping a Lisboa. Este acordo de cooperação visa promover investimentos chineses em infraestruturas e comércio entre os dois países, facilitando ainda mais as ligações entre a China e a Europa.
Xi Jinping em visita a Portugal de 4 a 5 de dezembro de 2018
Investimentos Estrangeiros Diretos Chineses
Desde a crise económica de 2008, que afetou profundamente Portugal, a China tornou-se um dos principais investidores estrangeiros no país, aproveitando as privatizações e a necessidade de recapitalização de empresas estratégicas. Vender, vender, vender, a qualquer preço, era a política do Primeiro-ministro Passos Coelho e do seu governo. Passos Coelho declarou o seguinte, que parece fake-news, mas não é:
A China aproveitou a fúria vendedora de Passos Coelho e comprou, comprou, comprou, a bom preço. Não pode ser criticada!
Alguns dos investimentos mais importantes incluem:
Energia: A China Three Gorges (CTG) comprou uma participação de 21,35% na EDP (Energias de Portugal), uma das maiores empresas de energia do país, em 2011. Esta aquisição deu à China uma posição de controlo significativa num setor estratégico como a energia. A CTG tentou aumentar a sua participação, mas a União Europeia bloqueou a tentativa devido a preocupações de concentração excessiva de capital chinês.
A REN – Redes Energéticas Nacionais – é a empresa responsável pela gestão das infraestruturas essenciais para a transmissão e distribuição de energia em Portugal, incluindo a eletricidade e o gás natural. Foi também vendida ao capital chinês.Bancos: O Banco da China abriu operações em Portugal e tem desempenhado um papel importante na promoção de relações comerciais e financeiras entre os dois países. Além disso, a China investiu em outros setores bancários, como o Haitong Bank, que adquiriu o Banco Espírito Santo de Investimento.
Seguros: Em 2014, o grupo de seguros chinês Fosun comprou a Fidelidade, a maior seguradora de Portugal. Esta compra foi um dos primeiros grandes investimentos chineses no setor de seguros na Europa e refletiu a estratégia chinesa de diversificação de investimentos.
Transportes: A China também tem interesse no setor de transportes de Portugal. O Porto de Sines, o maior porto de águas profundas do país, é uma das infraestruturas estratégicas que despertou interesse de investidores chineses. A sua localização geográfica, como porta de entrada para a Europa e o Atlântico, faz dele um ponto estratégico para as rotas comerciais ligadas à Nova Rota da Seda.
Rede Hospitalar: A aquisição pelo Fosun do Hospital da Luz que é uma das maiores redes privadas de saúde em Portugal, com várias unidades em todo o país, oferecendo serviços em diversas especialidades médicas, foi vista como uma oportunidade para fortalecer a presença chinesa nos serviços de saúde em Portugal-
A Venda da EDP
A atenção da União Europeia
A crescente influência chinesa em Portugal tem atraído a atenção da União Europeia, especialmente no contexto de preocupações mais amplas sobre os investimentos chineses em infraestruturas críticas em toda a Europa. A UE tem procurado estabelecer medidas para monitorizar e regular os investimentos estrangeiros em setores estratégicos, e Portugal não está isento dessas preocupações.
A União Europeia tem receio de que, ao permitir que a China controle infraestruturas cruciais, como portos ou redes de energia, alguns países europeus, possam comprometer a sua segurança e autonomia em áreas sensíveis.
Assinatura da venda da EDP ao grupo CTG - Chinês Three Gorges (Europe), S.A. Os representantes Portuguesas não escondem uma certa satisfação, que à data de hoje parece não se justificar.
EDP Venda Ruinosa? Ouve-se muito o argumento que a venda foi ruinosa, mas vê-se pouco uma justificação completa e clara, sobre esta opinião. Para quem valoriza a soberania energética e a autonomia sobre infraestruturas estratégicas, a venda da EDP e da REN são vistas como um erro que aumentou a dependência de Portugal de um poder externo com interesses geopolíticos, como a China.
Principal argumento a favor da venda: A CTG não foi apenas um comprador passivo. A empresa chinesa tornou-se um parceiro estratégico da EDP, especialmente no setor das energias renováveis. A EDP tem uma forte presença no mercado das energias renováveis, e a parceria com a CTG ajudou a expandir este segmento tanto em Portugal como internacionalmente. Através desta aliança, a EDP conseguiu reforçar a sua posição global no mercado das renováveis, beneficiando da capacidade financeira da CTG.
Principal argumento contra a venda: Os críticos argumentam que o preço pelo qual a EDP foi vendida foi baixo, dadas as suas capacidades e a sua posição no mercado de energias renováveis. Comparando com outras transações de empresas de energia na Europa, há quem defenda que Portugal poderia ter obtido um valor mais elevado. A ideia é que dadas as circunstâncias foi vendida ao desbarato.
Em última análise, a resposta dependerá da evolução futura da EDP, e da relação com a CTG, bem como da forma como Portugal gerir o equilíbrio entre necessidade de capital e preservação de ativos estratégicos.
Infelizmente são mais os exemplos da inépcia absoluta do Estado português para gerir estes negócios do que o inverso. Se Causa Democrática sabe que assim é, a China saberá tudo sobre como Portugal gere estas situações.
A economia nacional pode beneficiar do crescente interesse da China pela sua posição estratégica no Atlântico, especialmente em relação a rotas marítimas, como o porto de Sines. A ideia é desenvolver uma "parceria azul", (porque o mar é azul), com a China, que visa integrar Portugal na iniciativa da Nova Rota da Seda. Embora o Atlântico ainda não esteja incluído oficialmente neste projeto, a sua importância geopolítica tem vindo a aumentar.
A diplomacia portuguesa terá que encontrar um espaço entre os compromissos europeus e as relações históricas com a China e equilibrar seus interesses europeus e atlânticos, aproveitando as oportunidades oferecidas pela estratégia chinesa até 2050.
O setor empresarial português tem oportunidade de afirmar a sua relevância nesta nova fase de globalização. Portugal possui uma "rede de pérolas" que inclui portos e uma Zona Económica Exclusiva em expansão, o que pode aumentar a sua relevância comercial com a China. Por exemplo, atualmente, apenas uma fração do movimento de contentores no porto de Sines provém da China, o que indica um grande potencial de crescimento.
Além do comércio, uma oportunidade emergente está relacionada com o gás natural liquefeito (GNL), considerado crucial para a mobilidade marítima. A posição geoestratégica de Portugal pode otimizar as rotas de reabastecimento de navios a GNL. A ilha Terceira, por exemplo, tem potencial para se tornar uma estação importante de GNL no meio do Atlântico.
A China demonstrou também interesse na Base das Lajes, Açores, pela sua localização estratégica no Atlântico Norte, que facilita o acesso à Europa, África e América, tornando-a valiosa para operações militares e económicas.
Durante a administração do asnático Trump, os EUA revelaram desinteresse pela base, aprofundando uma redução iniciada em 2012, com Obama.
Trump adotou uma política de retração militar, abrindo espaço para a China sugerir investimentos nos Açores. Esta possibilidade preocupa EUA e União Europeia, que receiam a influência chinesa nesta área estratégica. A Base das Lajes, sempre de grande relevância para os EUA desde a Segunda Guerra Mundial, voltou a ser foco de atenção americana após o mandato de Trump.
Por fim, Portugal destaca-se não só pela sua localização, mas também pelas suas relações históricas com a China e pelo uso do português como língua na diplomacia chinesa, o que pode ser vantajoso no contexto global.
Estudantes chineses são habituais nas universidades portugueses para estudarem o direito português e a nossa língua, tendo em vista as relações com Portugal, mas sobretudo com as ex-colónias de Portugal. Angola é um objetivo importante para a diplomacia Chinesa em África.
Oportunidades de Portugal na Nova Rota da Seda
Em países como a Grécia, onde a China investiu no porto do Pireu, existe o receio de que a dependência de investimentos chineses comprometa a autonomia política. Com controlos em infraestruturas estratégicas, há uma perceção de que Pequim possa influenciar decisões internas para garantir interesses próprios.
Hoje, o Porto do Pireu, na Grécia, é um dos maiores investimentos chineses na Europa e serve como exemplo do alcance da Iniciativa do Cinturão e Rota. A empresa estatal chinesa COSCO Shipping detém 67% das ações da Autoridade Portuária do Pireu, o que lhe dá o controlo operacional e administrativo do porto. Este investimento começou em 2009, quando a COSCO assumiu o controlo de dois terminais de carga, e intensificou-se em 2016, com a aquisição da maioria das ações.
O controlo chinês sobre o porto tem várias implicações:
Infraestrutura e Expansão: Desde que assumiu o controlo, a COSCO tem investido na expansão das instalações portuárias e modernização de infraestruturas. Este desenvolvimento transformou o Pireu no maior porto de contentores do Mediterrâneo, aumentando a sua capacidade para receber navios de grande porte e consolidando-o como um ponto estratégico para a logística entre a Ásia e a Europa.
Influência na Cadeia Logística Europeia: A partir do Pireu, mercadorias chinesas podem ser distribuídas por toda a Europa com maior rapidez, via terrestre ou marítima. Este modelo logístico, que reduz o tempo e o custo de transporte, permite que a China se posicione mais fortemente no mercado europeu, garantindo um acesso privilegiado.
Emprego e Economia Local: O investimento chinês tem gerado empregos e receitas, revitalizando uma área que enfrentava dificuldades económicas. No entanto, há críticas de que a COSCO implementa práticas laborais rigorosas e que a influência económica chinesa pode dificultar o desenvolvimento de uma economia autónoma e diversificada na Grécia.
Receios de Soberania e Dependência: Com o controlo da COSCO, há receios na Grécia e na União Europeia de que a China possa influenciar decisões políticas e económicas gregas, dada a relevância do porto para a economia do país. Essa dependência gera preocupações sobre a autonomia grega em relação a decisões de segurança e política externa que possam afetar interesses chineses.
O Porto do Pireu representa um dos maiores pontos de influência económica e estratégica da China no sul da Europa, fortalecendo o seu papel como "porta de entrada" para a Europa e suscitando debates na UE sobre os impactos da influência chinesa em infraestruturas críticas.
A história das relações entre Portugal e a China é uma fascinante trajetória de cooperação e influência mútua, marcada tanto por oportunidades económicas como por desafios de soberania. Desde o primeiro contacto em 1513, passando pela criação de Macau, até à integração recente de Portugal na Nova Rota da Seda, o intercâmbio entre estas duas nações destaca-se pela construção de pontes culturais e comerciais que ainda hoje perduram.
Contudo, o crescente investimento chinês em setores estratégicos portugueses, como a energia, transportes, banca e saúde, levanta questões críticas. Se, por um lado, essas parcerias impulsionam a economia nacional e reforçam a posição de Portugal no Atlântico, por outro, suscitam preocupações sobre a preservação da autonomia e segurança nacionais, bem como a influência externa sobre decisões políticas e económicas internas. A experiência da Grécia com o Porto do Pireu, dominado por capitais chineses, exemplifica como o apoio económico pode vir acompanhado de riscos à soberania.
Neste contexto, Portugal encontra-se numa posição delicada: equilibrar os interesses nacionais com os europeus, maximizando as oportunidades oferecidas pela relação com a China sem comprometer a sua independência. A longo prazo, o sucesso deste equilíbrio dependerá da capacidade de Portugal em proteger os seus ativos estratégicos e de assegurar que esta nova fase de globalização e cooperação seja benéfica para ambas as partes, respeitando os valores europeus e a sua e sua autonomia .
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