Formação da Ideologia Política

por : Aharon Pereira

O que nos torna de direita ou esquerda? Nascemos com esta tendência ou é a educação que nos molda?

EDUCAÇÃO E BIOLOGIA NA FORMAÇÃO DA IDEOLOGIA POLÍTICA

O local de nascimento, a classe social, a família, o ambiente em que crescemos, os professores e amigos, bem como as experiências que vivemos, formam os alicerces que moldam as nossas visões políticas. A educação é um dos elementos mais poderosos para modificar e moldar o cérebro humano, que é altamente plástico, tanto a nível anatómico como fisiológico. As experiências na infância e na adolescência, em particular, deixam marcas profundas no cérebro que podem perdurar ao longo da vida, sendo reforçadas por comportamentos e interações sociais, especialmente quando traduzidas em sentimentos.

Contudo, o cérebro de todos é igualmente influenciável pela educação? E até que ponto a biologia que herdamos determina a nossa propensão a sermos de esquerda ou direita? Para explorar estas questões, vários estudos têm focado a dicotomia entre liberais e conservadores, revelando insights interessantes sobre como diferentes áreas cerebrais reagem a estímulos políticos.

Em 2007, um estudo das Universidades de Nova Iorque e da Califórnia mostrou que, em situações de conflito, os cérebros de liberais exibiam maior atividade na circunvolução cingulada anterior, uma área do lobo temporal responsável por responder a incoerências entre raciocínio e sentimento. Essa sensibilidade neurocognitiva mais elevada traduz-se numa maior adaptação dos liberais a situações que requerem mudança de comportamento. Os conservadores, por sua vez, mostraram uma resposta mais sistemática e persistente.

Outro estudo em 2011 pelo University College de Londres indicou que os liberais possuíam um maior volume de massa cinzenta na circunvolução cingulada anterior, enquanto os conservadores mostravam maior volume na amígdala, uma região associada a respostas emocionais intensas. Contudo, ainda não se sabe ao certo se estas diferenças estruturais provocam diretamente as orientações políticas ou se são consequência das mesmas.

Além disso, reações fisiológicas a estímulos de ameaça, como imagens perturbadoras ou sons altos, também podem estar relacionadas com a ideologia. Indivíduos mais sensíveis a estes estímulos tendem a apoiar políticas conservadoras, como a posse de armas ou a pena de morte. Em paralelo, a influência dos hormonas, como a ocitocina, foi investigada, com resultados que mostraram que a sua inalação pode aumentar a empatia e a cooperação com membros do próprio grupo, sem fomentar ódio por outros.

Fatores hormonais como o cortisol, conhecido como “hormona do stress”, também influenciam atitudes políticas. Pessoas com níveis elevados de cortisol tendem a participar menos em votações, enquanto eventos traumáticos podem provocar mudanças temporárias ou permanentes na orientação ideológica, como observado após o 11 de setembro de 2001 nos EUA.

A pesquisa sobre a influência dos genes na ideologia remonta a 1986, quando estudos sugeriram que os genes poderiam afetar opiniões sobre temas sensíveis como aborto ou imigração. Estes estudos compararam gémeos idênticos, que partilham 100% do material genético, com gémeos fraternos, partilhando apenas 50%, e notaram que os primeiros tinham opiniões mais similares. No entanto, questões como o tratamento parental e círculos sociais comuns entre gémeos idênticos complicam as conclusões, embora a ciência epigenética ofereça promissoras vias de investigação ao analisar como fatores ambientais podem ativar ou silenciar genes.

Aceitando a preponderância da educação, os dados sugerem que existem fatores biológicos que predispõem as pessoas a determinadas orientações ideológicas. Entre esses fatores, a reatividade emocional inata — a intensidade com que uma pessoa reage a contrariedades desde pequena — pode ser vista como um canhão cujo calibre herdamos. É, no entanto, a educação que aponta e dispara esse canhão, moldando o potencial herdado de cada indivíduo. (artigo publicado no El País)

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